segunda-feira, 24 de maio de 2010

BRASIL, IRÃ, TURQUIA E O ACORDO

O acordo de enriquecimento de urânio intermediado por Brasil e Turquia haveria que ser melhor ponderado pelas potências que o rejeitaram a priori. Falhas que podem ser apontadas na sua condução. Sempre a pergunta: o Irã é confiável em tema de tal gravidade?

Em 03.05.2010, escrevi o artigo Este “admirável” mundo louco demonstrando, entre temas fundamentais referentes aos desastres ecológicos, minha perplexidade pela indicação de Lula como uma das mais influentes personalidades políticas do mundo, nomeado entre outros pela revista Time, americana.

E o meu espanto fora ali revelado porque, a despeito da presença de Lula com o seu “aviãozão” - suportado por nós, contribuintes - por todo o mundo, não havia nada que pudesse, na minha concepção, justificar aquela honraria.

Eis que o recente acordo de controle do material radioativo do Irã, no qual houve a intermediação de Lula e do premier turco, Tayyip Erdogan, aceito pelo aiatolá Ali Khamenei autoridade máxima do pais iraniano e, claro pelo presidente Mahmoud Ahmadinejad, com repercussão mundial, soou para mim como um bomba do ponto de vista da política interna brasileira. Seus efeitos, para mim, naquele momento afetariam a pré-campanha presidencial, pela intensa exposição de Lula na mídia internacional e nacional. Outros fatores podem ter influenciado, mas é sintomático que sua candidata na última pesquisa Datafolha aparecesse já empatada com Serra, da oposição.

Nunca neguei e tenho defendido expressamente que o Brasil precisa de mudanças. E qualquer mudança se dará com a saída do PT do governo. Assumo isso com todas as letras ainda que se constitua, afinal, numa tentativa.

Sob o efeito do primeiro impacto, pensando em dar a mão à palmatória pelo êxito de Lula no Oriente Médio, me contive, porém. Esperei para ver quais seriam as decorrências imediatas – que não tardariam.

Antes os antecedentes:

O presidente russo, na visita de Lula à Rússia revelara-se cético no tocante à obtenção de um acordo com a sua intermediação. Dera a Lula apenas 30% de possibilidade. Por sua vez, o presidente Barack Obama, dos Estados Unidos, para alimentar o ego do “esse é o cara”, remetera uma carta diplomática incentivando Lula para tentar o acordo.

Havia, na realidade, uma linha anterior de descrédito por tudo o que ocorreria depois do acordo obtido, porque afinal, se tratava do dom quixote lá do Brazil, ora.

Eis que o acordo “brasileiro, turco, iraniano” foi firmado anunciado com pompa e circunstância, em minha opinião provocando tremenda perplexidade e despeito aos Estados Unidos, Rússia, China, França, Inglaterra e Alemanha.

Diante disso, essas potências tentaram ignorar o acordo, sem saber rigorosamente quais eram suas disposições e proclamando num uníssono e imediatamente que retaliações ao Irã ocorreriam autorizadas pelo Conselho de Segurança da ONU.

Há que indagar:

O Irã merece confiança a ponto de ser aceito o acordo conduzido por dois países “emergentes”? Não teriam Brasil e Turquia feito tudo às pressas sem consultas cautelares às grandes potências? (O premier turco veio às pressas para fechar o acordo, numa reunião que durou apenas 18 horas). Para caso dessa magnitude, com o Irã desafiando sistematicamente o ocidente, em especial os Estados Unidos, não seria o caso de aumentar desde logo o bloco de negociadores num segunda rodada?

Essas indagações são legítimas, mas não poderia o acordo ser recebido com o desdém que foi, começando por Hillary Clinton (a despeito do “esforço sincero do Brasil”) que tem mostrado em muitas intervenções sensibilidade e senso. Deveriam, em lugar de rejeitá-lo a priori, ter ponderado sobre novas premissas com o objetivo de chancelá-lo proximamente se conseguidos os créditos.

Ademais, pelo Brasil, o Irã poderia olhar o Ocidente com menos reservas e, quem sabe, agir diplomaticamente de modo mais produtivo – e por aí controlando as bobagens que diz e faz Ahmadinejad tentando constranger o Ocidente.

Estava em meio a tais ponderações, aceitando as boas possibilidades do acordo, quando dias depois, uma notícia não devidamente explicada ou explorada dava conta de um anúncio que surpreendera o “governo brasileiro”: a despeito do acordo tão festejado, o Irã não abrirá mão de enriquecer urânio em até 20%. (1)

E o acordo? De 20% vai a quanto no futuro? A bomba atômica no fundo, não é uma real aspiração iraniana? O Irã abrirá as portas de suas usinas para que inspetores da ONU, sempre que entendam necessário possam fiscalizá-las já que continuará com o enriquecimento de urânio?

Há, pois, flancos abertos no conjunto todo da negociação havida pelo que haverá que se dar tempo para que essas indagações sejam respondidas. Há muito que esclarecer.

No calor de todo esse debate o premier turco Tayyip Erdogan diria:

“Este é o momento de discutir se acreditamos na supremacia da lei ou na lei dos supremos. Enquanto os EUA ainda têm armas nucleares, de onde tiram credibilidade para pedir a outros países que não as tenham”. (2)

Realmente os Estados Unidos desenvolveram a bomba por conta da ameaça alemã durante a Segunda Guerra que também perseguia sua fabricação.

Sim, a experiência atômica foi dos Estados Unidos no Japão.

Com o fim da guerra, sobreveio a “guerra fria”, o poderio russo, ostentado, ameaçador o que incentivou, infelizmente, outras potências a fabricarem também suas ogivas nucleares. Não é segredo que hoje alguns poucos países, sem serem “potências” também dispõem desse armamento tão devastador.

Acredito que essas armas tão letais estão sob controle nos países que as detém, mas eu respondo à indagação do premier turco com preocupação externada pelo investidor Warren Buffet que com Bill Gates dedica-se à caridade bilionária. Mais ou menos nestes termos:

“Temos que evitar a proliferação de armas nucleares porque tem muita gente má no mundo.”

Os que possuem a bomba nós já conhecemos; os que aspiram tê-las são uma incógnita até pensando na possibilidade de transferência de tecnologia clandestina.

É isso aí.

“Salve” o 11 de setembro.

Referências no texto:

(1) “O Estado de São Paulo” de 20.05.2010

(2) “O Estado de São Paulo” de 23.05.2010

Um comentário:

  1. Milton, as negociações sobre o tema lembram-me um dito popular já "esquecido": Diga-me com quem andas, que te direi quem és!"

    Abraço.

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