terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

A “FICHA LIMPA” VINGOU NO STF


Decisão histórica, ofuscada pela quinta-feira de carnaval. Esperança de moralização da Administração Pública no seu todo. Disposições importantes trazidas pela LC n° 135/2010 – a Lei da "Ficha Limpa".




No que concerne às dúvidas sobre o projeto popular da Lei da "Ficha Limpa” à época, já escrevi, tecendo considerações sobre as discussões que se davam precisamente no último quadrimestre de 2010: o artigo “O impasse da lei da “Ficha Limpa” de 26.09.2010.

Em março de 2011, relembre-se, por 6 x 5, o Supremo Tribunal Federal decidira pela inaplicabilidade da Lei (voto de desempate do Ministro Luiz Fux, recém empossado), por conta do artigo 16 da Constituição Federal a saber:

Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência.

Entre outros, como decorrência dessa decisão, foi empossado no Senado ninguém menos que o “notório” Jader Barbalho que renunciara a mandato anterior para não ser cassado, sob acusação de ato de corrupção.

Passado esse momento, voltou há pouco o STF à matéria para decidir sobre ações diretas de constitucionalidade e inconstitucionalidade da Lei.

O julgamento histórico se deu no quarta e quinta-feira que antecederam o carnaval, com “globeleza” e tudo, instante que de certo modo ofuscou o real significado da decisão.

A questão central da divergência se referia à condenação penal, o seu momento, que seria o seu trânsito em julgado após decisão de última instância, que poderia se dar mesmo nos tribunais superiores.

A Lei da Ficha Limpa estabelece que a inelegibilidade se dê no nível dos Tribunais de Justiça ou Regionais Federais (“órgãos colegiados”).

Ora, com a tramitação lenta dos processos no todo do Judiciário brasileiro, com os inúmeros recursos legais, a ação penal pode perdurar por anos sem decisão definitiva podendo se dar a prescrição que extingue a punibilidade.

Nessa válida discussão, entre a suficiência da decisão de “órgãos colegiados” dos Tribunais e o trânsito em julgado da ação penal, o seu teor pode ser sintetizada no posicionamento do Ministro Dias Toffoli que votou contra a constitucionalidade da Lei "em respeito ao princípio da presunção de inocência, (pelo que) só pode ser considerado inelegível o cidadão que tiver condenação transitada em julgado" (quando não cabe mais recurso). Mas, no tocante à retroatividade da lei, o ministro votou pela aplicação da lei a fatos ocorridos anteriores à sua edição.

Por outra, a Ministra Rosa Weber, recém-empossada no STF, provinda do Judiciário do Trabalho, ainda com uma visão menos técnica no que se refere aos múltiplos embates no Tribunal concluiu seu voto pela total constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa, destacando que "a norma é fruto de um esforço hercúleo da sociedade para instituir no âmbito político normas moralizadoras, que impeçam a malversação da coisa pública". E "a dispensa do trânsito em julgado na hipótese de haver condenação colegiada, como previsto na Lei da Ficha Limpa, não afronta o princípio da não culpabilidade" (1).

Em outras palavras, sem fugir da seriedade do texto: uma coisa é uma coisa (processo penal) outra coisa é outra coisa (processo eleitoral). Raciocínio engenhoso e válido? Sim!

Como disse Célio Borja ex-ministro do STF:

“O STF decidiu bem. Mas, há gente por aí confundindo direito eleitoral e direito penal” (2)

Resultado: 7 votos a 4 pela constitucionalidade da Lei, que incidirá mesmo sobre ocorrências anteriores à sua vigência além de convalidar a inelegibilidade por oito anos dos políticos que renunciaram ao mandato para escapar de punições, mesmo que tenha se dado anteriormente à vigência da Lei que passa a valer nas eleições deste ano.

E há um detalhe importante: a Lei se aplica aos profissionais liberais que tenham sido banidos de seus órgãos que congregam a respectiva profissão, como OAB, CRM, CREA (“os que forem excluídos do exercício da profissão, por decisão sancionatória do órgão profissional competente, em decorrência de infração ético-profissional, pelo prazo de 8 (oito) anos, salvo se o ato houver sido anulado ou suspenso pelo Poder Judiciário.”)

Este item tende a trazer questionamentos futuros, porque há banimentos não decorrentes de ato ilícitos.

A Lei da Ficha Limpa é a Lei Complementar n° 135 de 04.06.2010 que alterou a LC n° 64 de 18.05.1990. (3)

Legendas:

(1) “Notícias do STF” de 15.02.2012

(2) “O Estado de São Paulo” de 16.02.2012

(3)http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp135.htm

Foto: Ministra Rosa Weber, recém empossada no STF. Era Ministra do TST.

Um comentário:

  1. Claro e preciso, Milton. Esse tipo de ordenamento revela, sobremaneira, um dos fatores pelo qual tem sido questionado: o medo de serem julgados. Não houve como barrá-lo no Congresso, a maioria do STF não quis correr riscos mas, para "neutralizá-lo" estão os infinitos recursos e procrastinações à disposição dos picaretas de ontem, hoje e amanhã.
    Essa, a Justiça dos homens, no Brasil. A de Deus, ao que saiba, jamais se manifesta.
    Abraços, e parabéns.

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