domingo, 29 de maio de 2011

O INÍCIO DA TUTELA. Dilma vs Lula

Os desgastes da presidente Dilma Roussef nestes dias. A derrota no Câmara na votação do Código Florestal e o confronto com o PMDB. A tutela de Lula. A “ciência do não”...e do sim. PEQUENAS NOTAS: “Predadores do mundo, uni-vos”; A Copa do Mundo fora de São Paulo.


Durante a campanha eleitoral havida no ano passado para a presidência da República, não foram poucos os artigos que escrevi externando a preocupação com a influência de Lula no governo Dilma, se ela vencesse.

Desconhecida, avalizada por Lula, com um discurso quase idêntico ao seu padrinho, quem pensasse em mudanças não poderia apoiá-la como não apoiei.

Afinal de contas, o petismo fora acusado ou partícipe de tudo quantos desvios morais nos oito anos do governo Lula, sem contar com as alianças espúrias gerando um falso clima de país feliz e realizado.

Mas, por baixo do tapete, havia, como há, uma educação precária, assistência médica vergonhosa e, pior, durante a campanha, esses flancos não foram explorados pelo PSDB e seu candidato.

No caso do Ministério da Educação, em lugar de partir para resolver a precariedade de escolas e professores assume projetos medíocres, como o da campanha anti-homofóbica que em boa hora foi suspensa por Dilma. Sem essa de conservadorismo, a relação homem-mulher é a normal, “pelo menos por enquanto”. As relações homoafetivas haverão que apenas ser toleradas, jamais incentivadas.

E o que dizer do livro que, de certo modo tolera o falar errado, embora advirta que o aluno que assim se expresse está sujeito a “preconceito linguístico”. Criou-se mais um preconceito, um novo besteirol neste país que sofre de acefalia.

Na minha visão tão imparcial quanto possível, penso que o atual ministro da educação, apadrinhado de Lula – preferido para disputar a prefeitura de São Paulo – e por causa disso lá está – já deveria ter deixado o governo.

Mas, é mantido, arrumando para si, um desgaste após outro.

Dilma, já não fossem os vídeos anti-homofobia cuja consecução suspendeu, teve um terrível desgaste esta semana, com a derrota na votação do “novo” Código Florestal ignorada pelo PMDB – partido da base de governo – quando pressionou os seus deputados para rejeitar alguns pontos do projeto que não concordava. Contrariada foi para o confronto com o partido de sua base, resultando na intervenção de Lula que acabou por tutelá-la.

Lula buscou os seus aliados para amenizar a crise, a par de apoiar Antonio Palocci objetivando amenizar as suspeitas do seu enriquecimento que se dera com a velocidade de um carro “fórmula 1” em quatro anos.

Nas suas sempre presentes comparações futebolísticas, que beiram o ridículo, Lula considerou Palocci a um tipo de Pelé na sua função – o que se constitui num absurdo risível.

A mim parece que, salvo empenho superior de Dilma com eventual desgaste pessoal, Palocci, tanto quanto o ministro da Educação, haveriam que, num dado momento deixarem o governo. Palocci, particularmente, já demonstrou “fraquezas” em sua conduta quando ministro de Lula.

A tutela lulista chegou ao ponto de aconselhar Palocci e Dilma, diante do seu distanciamento dos parlamentares em atendê-los.

Dilma que talvez tentara se afastar dos conchavos dos quais seu partido se especializara tudo por conta do “nunca antes visto neste país”, agora na iminência de mudar a sua cartilha para a lição do sim, sim, sim.

Há, todavia, uma longa análise jornalística da qual destaco o trecho seguinte referindo-se aos não, não, não:

“Eu não vou misturar votação do Código Florestal, que ainda passará pelo Senado, com distribuição de cargos. Não vou, não vou e não vou”, esbravejou Dilma em almoço com a bancada do PT no Senado, na quinta-feira, quando questionada sobrea montagem do segundo escalão.” (1)

Num outro espaço, em forma de crônica, vali-me de antigo conto de Malba Than (pseudônimo de Júlio Cesar de Melo e Souza, 1895-1974) contido em velha edição (1962) da “Coleção Saraiva” sob o título “O Terceiro Motivo (Contos e Lendas Orientais)”. O conto principal é esse que dá nome ao livro embora inúmeros outros façam parte do pequeno volume. (2)

O pequeno trecho do livrinho de Malba Tahan de que me valho para os devidos balanceamentos, refere-se à “Ciência do não” ou o modo de gerir um governo sério (naqueles tempos de paz, destacando-se Bagdá como a cidade pérola do Islã):

“- A Ciência do Não, ó Príncipe do Islã, envolve leis, princípios e teorias que exprimem preciosos conhecimentos para aqueles que desejam governar com critério e dignidade.

- E é muito antiga essa Ciência? – inquiriu o Califa de Bagdá – esboçando um sorriso de benevolência.

- Antiquíssima – atalhou o sábio Zeidan, num gesto afirmativo, ostentando saber, - Tal ciência acompanha o mundo e os homens desde os primeiros albores da criação.

(...)

E assim o Príncipe, para a defesa do erário, para resguardo mesmo do seu bom nome, vê-se forçado a dizer vinte mil vezes. Não! Não! Não!(...) Proferir não é, em geral, bem mais difícil do que responder sim. E governar, ó Comendador dos Crentes, governar é dizer não. Não, para aqueles que planejam guerras e conquistas. Não, para aqueles que solicitam criação de cargos inúteis ou promoções iníquas. A Ciência do Não é, pois, imprescindível para a cultura do verdadeiro Rei! Repito – Governar é contrariar, é proibir, é vetar!”

O que a meu ver demonstrara o governo Dilma nos primeiros meses talvez pelo seu temperamento, fora a adoção da “ciência do não”. Mas, houve o choque de princípios porque assim não agira o seu partido ao longo dos oito anos que sucedera. Há o vicio “cultural”, o vicio do “sim”.

Dilma sobreviverá com facilidade se adotar a “ciência do SIM”, infelizmente, em linha com o que recomendou e aplicou o seu padrinho quando presidente.

Ainda que assim seja, haverá que se posicionar de modo a que a tutela de seu padrinho não se repita, não se torne lugar comum.

Já imaginaram um “presidente paralelo”? Impensável, inaceitável, indigno.

PEQUENAS NOTAS:


1. Predadores do mundo uni-vos. Inspirai-vos na “Revolução do Brasil”


O jornal “O Estado de São Paulo” de 29.05.2011, a seu pedido, calculou o professor Gerd Sparovek da ESALQ-USO a extensão possível do desflorestamento que resultará da adoção, do modo como aprovado na Câmara Federal: nada mais nada menos do que 22 milhões de hectares, algo próximo à área do Estado do Paraná. (3)

Evidentemente que esse projeto aprovado pela Câmara, que fez o jogo radical dos pecuaristas e, por isso, antiecológico, haverá que passar pelo crivo necessário do Senado que se obrigará a fazer correções aos excessos e, se assim não se der, até o desgaste adicional de Dilma em vetar algumas disposições na hora da sanção.


2. Copa do Mundo: São Paulo de fora


Desconfio que não vai vingar a Copa do Mundo em São Paulo. O “Itaquerão – Corinthião” nem começou e se trata de obra imensa que pode não estar pronto até 2014.

A FIFA impaciente e desesperada ameaça tirar São Paulo da festa. Loucura, hem! Pouco ou nada escalado para São Paulo, onde se alojarão os milhares de torcedores e jornalistas? Está por aqui a maior e melhor rede hoteleira do País.

Não haverá trem-bala. Aeroportos ainda que “reformados”, fora de São Paulo, tendem ao colapso total.

De fora o Morumbi do São Paulo, cuja diretoria ao saber de sua exclusão “deu de ombros” e não lutou por ele, o estádio do Corinthians nem começado (*) restaria apenas a “arena Palestra”, do Palmeiras, como o mais viável no momento.

Bom que se esclareça que esse assunto não se resolve com recados e restrições da FIFA provindas da Suíça, mas de reuniões sérias, de compromissos e cronogramas a serem exigidos.

Ah sim, não necessariamente com a presença do presidente da CBF. Aliás, essa entidade está indevidamente situada no Rio de Janeiro ainda.


Referências:


(*) O estádio do Corinthians começou neste 30 de maio, de modo ainda incipiente. Aguardemos a evolução das obras.

(1) Jornal “O Estado de São Paulo” de 29.05.2011;

(2) “Temas Livres” ( http://martinsmilton.blogspot.com): A”Ciência do Não” (Segundo Malba Than) de 24.05.2011;

(3) Jornal “O Estado de São Paulo” de 29.05.2011 (“Novo Código permite desmatar mata nativa em área equivalente ao Paraná” de Andrea Vialli e Afra Balazina)

Um comentário:

  1. Belíssimo o seu artigo "O início da tutela". O encerramento, com a citação do livro de Malba Than foi magistral!

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