A longa evolução até o divórcio direto que se deu há dias com a mudança na Constituição. A contribuição da legislação previdenciária até ser ele alcançado. Dúvidas quanto ao “divórcio litigioso”.
O revogado Código Civil de 1916, para regular de modo precário o fim da sociedade conjugal, previra o desquite litigioso e amigável, neste caso, conforme redação seguinte:
Dar-se-á também o desquite por mutuo consentimento dos cônjuges, se forem casados por mais de dois anos, manifestado perante o juiz e devidamente homologado.
Ao casal desquitado, eram vedadas novas núpcias, estabelecendo-se então, com novo relacionamento duradouro entre os ex-cônjuges, aquilo que se chamou “concubinato”, termo que me pareceu, sempre, inadequado. Afinal, “concubina”, em edição mais antiga do Caldas Aulete induzia um significado mais além do simples conceito de “mulher infiel”. (no Aurélio, edição recente, entre outros significados, lá está um significado mais consentâneo: “Forma de união conjugal socialmente reconhecida...”).
Mas, antes que fossem introduzidos a separação judicial e o divórcio no direito brasileiro, caminhava em pista própria verdadeira evolução na legislação previdenciária para reconhecer e regular direitos que decorriam das relações “conjugais” duradouras e nem tanto reconhecidas, então.
Com efeito.
Há que retornar aos idos de 1964, tomando-se o teor da súmula 380 do Supremo Tribunal Federal: “Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum”.
Estava implícito nesse enunciado, não só a partilha de bens amealhados na constância da sociedade de fato, mas ai haveria que ser regulada a guarda dos filhos e os alimentos para manutenção de sua vida natural e educacional.
Essa súmula nada mais fazia do que reconhecer uma situação real de concubinato naquele sentido de “forma conjugal socialmente reconhecida...”
Em 1973, ressaltando-se que não muito antes fora rejeitada a emenda do divórcio, a Lei n° 5890/73, inseriria a “companheira” (e não concubina) como dependente da previdência social, abrindo uma fresta adicional de reconhecimento das relações duradouras que não as do casamento.
Na exposição de motivos do Ministro do Trabalho de então, Júlio Barata, lia-se:
“É meu dever sugerir a V.Exa., medidas que ponham cobro a uma situação real existente qual a formação do grupo familiar à margem da lei: a figura da companheira, diluída na legislação em vigor, na de pessoa designada, é uma realidade que não pode ser mais, a esta altura, posta à margem ou desconhecida”.
Nessa linha, em 1975, com nova redação dada a parágrafos do artigo 57 da Lei n° 6.0215/73, embora restritivamente pois que somente “havendo motivo ponderado e excepcionalmente” fora admitido à mulher requerer ao Judiciário a averbação do nome do companheiro, se este também concordasse.
Esse encaminhamento, no meu modo de ver, continha no seu bojo uma perspectiva divorcista, mesmo que não fosse algo deliberado naqueles dias. Havia, sim, uma situação de fato, pressionando a revisão do instituto das relações conjugais.
Não demoraria muito.
Pela Emenda Constitucional n° 9/77, viria finalmente o casamento a ser dissolvido pelo divórcio, cuja regulamentação se deu pela Lei n° 6.515/66.
Deste modo:
Um ano após a separação judicial, qualquer dos cônjuges poderia requerer o divórcio, ou dois anos de separação de fato devidamente comprovada.
Onze anos mais tarde, a Constituição de 1988, estabeleceria (§3º do art. 226) que, “para efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre homem e mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.
A Lei n° 8.071 de dezembro de 1994 regulou o direito dos companheiros que tivessem convivido por mais de cinco anos ou com filhos, o direito de pleitear do outro alimentos (pensão), além de estabelecer regras na sucessão dos bens, no caso de morte de um deles. Logo depois, em maio de 1996, a Lei n° 9.278 aperfeiçoaria esses princípios no que se refere à divisão dos bens adquiridos na constância da união duradoura, omitindo até mesmo o tempo de convivência para o seu reconhecimento, desde que fosse “pública e contínua”.
Esse estado de coisas, praticamente se consolidara no direito brasileiro: a relação duradoura reconhecida “convivendo” com o casamento formal, destacando-se, claro, que este último ser dará entre homem e mulher:
Código Civil de 2002 – art. 1514:
O casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz os declara casados.
Homem e mulher! Inaceito, pois, o casamento homossexual que considero uma relação “conjugal” anômala.
Todo advogado que trabalha na área de família, sente os impactos da separação pela decisão do rompimento, dolorosa para muitos casais, que se obrigavam ainda a esperar o divórcio por um ano (ou a comprovação de dois anos de separação de fato), para o resolução definitiva do ponto de vista legal, daquele casamento que não prosperou.
Se essa espera tivesse por princípio a expectativa da reconciliação, na verdade se ela tiver que se dar ela se dará a qualquer tempo, antes ou depois de vencido o prazo entre a separação e o divórcio.
Esse duplo processo, geravam queixas de tutela estatal excessiva nestes tempos velozes de mudanças em assuntos que só interessam ao casal.
Uma evolução, muito divulgada há pouco, a mudança constitucional que exclui a separação judicial, determinando desde logo a decretação do divórcio.
Emenda Constitucional n° 66 de 2010, com simplicidade:
“O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio.”
A mim parece que o divórcio consensual entre o casal sem filhos pode se dar desde logo, ou no Judiciário ou por escritura pública lavrada no Cartório de Notas. Se houver filhos menores, o divórcio será necessariamente judicial para preservar os alimentos de educação deles.
Minha dúvida reside na proposição do “divórcio litigioso” quando os cônjuges têm pendências a resolver e que não se dá amigavelmente ou apenas um deles, por razões “insuportáveis”, o pleiteia.
Mas, isso, creio, logo se resolverá, até porque pode se basear nos princípios que norteavam a separação litigiosa.
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