domingo, 26 de dezembro de 2010

DA EXPULSÃO DOS TRAFICANTES DOS MORROS CARIOCAS AO CRACK

A expulsão dos traficantes dos morros cariocas foi uma ação importante. Os antecedentes para explicar tantas armas e drogas. O combate ao tráfico. O crack e a devastação física e psíquica que provoca nos viciados. Falta de políticas de saúde.

A expulsão dos bandidos e traficantes do Complexo do Alemão no Rio de Janeiro continua sendo comemorada até pelo modo como se deu a sua fuga. Pelos esgotos e caminhos tal qual ratazanas assustadas em vias de serem abatidas.

Ação coordenada entre as forças do Exército e polícia foi espécie de “satisfação para o mundo” de que o Rio de Janeiro “limpava” os seus morros de tal modo a viabilizar sua parte na próxima Copa do Mundo e a organização das Olimpíadas de 2016. A certeza de que o tráfico não domina o Rio de Janeiro.

Foi, sim, uma ação vigorosa e alívio de se ver.

Mas, sempre um “mas”, faço perguntas que não me calam:

Como foi possível esses bandidos acumularem toneladas de drogas nos morros e, mais, a quantidade de armas de grosso calibre que do mesmo modo tinham à sua disposição? Como todo esse arsenal chegou até lá sem que houvesse interceptação? Não fossem os atos insanos de “guerrilha” desses bandidos em atacarem a cidade com a queima de ônibus e outros vandalismos toda essa droga e armas ainda lá estariam? A quem pode ser atribuída a responsabilidade pelo domínio conquistado pelos marginais a poder de armas e drogas nos morros?

Pergunto, mas não creio que os atores da bem sucedida operação de resgate respondam. Que se comemore e vitória e os louros merecidos! O resto é passado (?).

Valho-me, porque entendo perfeitamente aplicável no que se refere à organização (desmantelada) dos marginais nos morros do Rio de Janeiro, de resposta do futuro Ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, à indagação do seu modo de combater a corrupção e os crimes do colarinho branco:

“O crime organizado não vive sem corrupção de autoridades estatais, de todos os níveis, de todos os poderes, que muitas vezes guardam conexão com o crime do colarinho branco. Dificilmente um crime se organiza em larga dimensão se não houver a conivência de parte do aparelho do Estado. Então, o enfrentamento do crime organizado passa pelo enfrentamento da corrupção (...)” (1)

Claro, pois, que toda a droga encontrada no “Complexo do Alemão” e as armas de grosso calibre apreendidas são indícios fortes de corrupção porque tudo está indicando que passaram nas “barbas” das autoridades que deveriam apreendê-las num processo contínuo de fiscalização.

De outra parte, a quantidade de drogas apreendidas dá uma idéia tênue do que armazenam nas suas pocilgas os traficantes do Rio de Janeiro. No silêncio, os traficantes que sobreviveram no Rio de Janeiro e fugiram tendem a se reorganizar porque o lucro é fácil, o vício é grande e a corrupção sempre possível.

Mas, o problema não é só do Rio de Janeiro. É, também, de São Paulo e de outros grandes centros.

O combate à entrada das drogas no País, pois, está a exigir ações enérgicas e permanentes nas fronteiras com a Bolívia e Paraguai, sem tréguas. Pouco resolve cuidar das entradas principais e deixar as entradas secundárias livres com a desculpa de que não é possível controlá-las todas.

Há, sim, que se combater o consumo mas, primeiro, há que se combater o tráfico, a facilidade da obtenção das drogas.

Presentemente despertam as autoridades não só para os perigos da maconha – um largo atalho para o consumo da cocaína e do crack. Os malefícios desta última, que cria zumbis modernos, violentos ou não vivem em regiões promíscuas e imundas de São Paulo, tolerados e, pior, ignorados pelas autoridades.

O colunista do portal “VoteBrasil” Segadas Vianna no seu artigo “O Brasil (infelizmente) aprendeu a conviver com o crack”, diante desse “fenômeno”, afirmara:

“Outro dia fiquei chocado com a naturalidade que um repórter de televisão narrava uma notícia. ele dizia com a maior naturalidade: - 'Estamos nos aproximando da região da cracolândia (em SP). Ou seja, a cracolândia paulistana virou uma 'região' da cidade.

Hordas de mortos vivos se amontoam nas ruas da maior cidade do país e morrem e matam sob o olhar indiferente das autoridades e de boa parte da população. Pais vagam desesperados atrás de seus filhos fugidos para as cracolândias.”
(2)

O crack, é bom esclarecer, é um subproduto da pasta da cocaína diluída com solventes e misturada com bicarbonato de sódio ou amônia. As pedras, são fumadas em cachimbos improvisados. O nome provém do inglês “crack” que significa ‘quebra’, por conta dos estalos produzidos pelas pedras no processo de queima. Em poucos segundos a fumaça chega ao sistema nervoso central produzindo forte sensação de euforia – superior à da cocaína. Passado o efeito, o viciado entra num processo depressivo o que o obriga a novamente consumir a droga. (3)

Seu consumo se expande porque é mais barata que a cocaína.

Há pouco, em manchete, a imprensa noticiou que na rede particular de ensino, 55% dos alunos já usaram drogas; na rede pública, 40%. O levantamento feito pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad) com quase 51 mil alunos em todas as capitais revelou que os estudantes, no porcentual acima seja escola particular, seja pública, já consumiram maconha, cocaína e crack pelo menos uma vez. (4)

A mesma notícia aponta a omissão oficial no que se refere à área da saúde. Segundo o Ministro José Gomes Temporão, seria “romântica” a ideia de basear o combate ao problema com ações na área da saúde”, acentuando que é preciso combater o tráfico.

É que fora gasto apenas 2% dos R$100 milhões previstos no “Mais Saúde”, dentro do “Programa de Enfrentamento de Crack e Outras Drogas” (5).

Como se observa, então, em termos de política de saúde, a omissão do Governo Brasileiro fora total e ainda com a desculpa, segundo o Ministro, que a “solução” está apenas no combate ao tráfico. E os viciados, os doentes do crack de hoje?

Ora, que fiquem vegetando nas cracolândias. Essa conclusão é o que se depreende da resposta do Ministro da Saúde que está saindo do Governo.

Estou me estendendo muito, mas procuro ressaltar a complexidade do tema: o tráfico livre até aqui, a corrupção em setores oficiais considerando o volume de drogas e armas em poder dos traficantes, a devastação física e psíquica que produz nas vítimas o crack, principalmente, e outras drogas e a falta de efetividade numa política de saúde do Governo Federal.

→ →(Coloco-me disponível para sugestões, críticas e principalmente correções às minhas opiniões e informações).

Referências no texto:

(1) Jornal “O Estado de São Paulo” de 12.09.2010

(2) “O Brasil (infelizmente) aprendeu a conviver com o crack” – VoteBrasil.com de 08.12.2010.

(3) Informações extraídas da Wikipédia.

Segadas Vianna sintetiza o que seja o crack deste modo: “O que é o crack ? O crack, também conhecido como ‘pedra’ é um subproduto do processamento da cocaína. A cocaína, durante seu processo de elaboração tem de ser lavada com éter ou acetona ou até mesmo querosene e desta ‘lavagem’ resulta a cocaína, que vai ser secada para a venda e os resíduos que ficam no tanque de lavagem. Este resíduo é o crack.” (“Saiba tudo sobre o crack – a droga da morte” – coluna VoteBrasil de 03.12.2009)

(4) Jornal “O Estado de São Paulo” de 17.12.2010.

(5) Jornal “O Estado de São Paulo” de 17.12.2010

Foto: Criança consumindo crack (Google)

domingo, 19 de dezembro de 2010

OVELHAS QUE NÃO BALEM

O golpe contra o povo brasileiro: aumento de 62% nos salários dos deputados e senadores em votação simbólica. A ausência de protestos do povo brasileiro nas ruas. "Somos todos ovelhas que não balem conduzidos ao sacrifício da imoralidade."

Nesta “coluna” já demonstrei minha indignação com o Congresso Nacional pelos seus desmandos ao nível do deboche contra o povo brasileiro, insurgi-me contra o número de deputados e senadores, em maior número do que o Congresso americano – proporcionalmente no que se refere aos senadores –, não resisti ao presidente Lula, o “homem com 80% de aprovação” de sua gestão, pelo ridículo de muito de seus discursos e ações, pela soberba que o assalta “como nunca antes neste país”, ao eleger sua candidata desconhecida no cenário político brasileiro, ao posicionar Sarney como personalidade acima do bem e do mal, retribuição pelos panos quentes de que teria se servido o senador nos tempos incertos do “mensalão”, e com o próprio parlamentar maranhense, eleito pelo Amapá, por manter seu estado, o Maranhão, o mais miserável do país – e por miserável lá mantém o seu domínio. Com o PMDB oportunista e mercenário na busca de cargos em troca de apoio ao poder dominante e minha irritação com o sorriso de giaconda de seu presidente, agora eleito como vice.

O quê mais?

Que busquem nas nove dezenas de colunas aqui publicadas.

Como se dá na grande imprensa não tenho me omitido naquilo tudo que me indigna e sob minha ótica faz esta país um campo de abusos, de impunidade, de corrupção em todos os escalões...

Mas, a imprensa de um modo geral é fugaz. De regra – há exceções – uma denúncia de hoje, um editorial bem formulado, são “arquivados” na edição de amanhã e assim sucessivamente. Mas, esse fato não pode gerar esmorecimentos.

Pois bem. No dia 15 último, o Congresso Nacional elevou seus vencimentos, de R$16.512,00 para R$26.723,00 significando elevação de 62%.

Este é um país pobre, com milhões de cidadãos passando fome. Esses salários, quinze ao ano, superam os vencimentos de congressistas de países do denominado 1° Mundo

Tiveram os congressistas como paradigma os vencimentos do Supremo Tribunal Federal. Mesmo não estando a mais alta Corte Judiciária num momento de superação, equipararam o humilde Tiririca, semialfabetizado a qualquer ministro do Supremo. E outros tantos em condições pouco melhores que se elegeram.

E claro que com ele, já “diplomado” como deputado, as coisas ficaram piores, em contraposição ao seu “slogan” tão repetido, “vote em Tiririca, pior não fica”!

Esse reajustamento imoral, por força de disposição constitucional, poderá gerar efeito cascata, autorizando reajustamentos na mesma proporção nas Assembléias Legislativas e Câmaras Municipais, respectivamente, em todos os Estados e Municípios brasileiros. Não só imoral o ato unilateral legislando em causa própria, mas também irresponsável.

Tenho ouvido em todos esses dias comentários tão jocosos quanto descabidos de circunstantes, mas todos apontam o absurdo dos aumentos. Todos se conformam, dão de ombros, reclamam que de modo doloroso pagarão o imposto de renda em 2011 para sustentar as garras da rapina. Dinheiro jogado no esgoto!

A imprensa ainda insiste. O jornal o “Estado” de hoje publica charge do formato de Brasília, um avião e os “sinais particulares” tem como legenda, “ave de rapina”.

Mas, como disse, os jornais têm a fraqueza da fugacidade.

Claro que esses congressistas se aproveitaram das festas de fim de ano e a volúpia das compras de Natal que provocam, do “oba-oba” da posse próxima, da loquacidade de Lula e os seus 80% de aprovação, para incluir no pacote esse ataque contra a bolsa do povo brasileiro.

Mas, pelo jeito, nada mudará as disposições dos congressistas.

O povo brasileiro se conforma, se acomoda, não reage, faz ironias na hora do jantar, vê sua novela que o aliena e dá o dia, cada dia, como realizado.

Na verdade, para mudar esse e outros abusos, o povo teria que sair às ruas promovendo protestos veementes (nada com vias de fato), uma espécie de CCQ gigante que acue esses congressistas fazendo-os mudar seus atos insensatos, serem controlados pelo povo presente.

Esqueçam abaixo-assinados, lista de protestos na internet!

Sem protestos de rua, todos somos nada além do que ovelhas que não balem preparados para o sacrifício no altar da imoralidade.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

CLIMA: CANCÚN DEVAGAR MAS CAMINHOU

Cancún deu passos nos rumos de um acordo climático que se espera ocorra em 2011 na Conferência em Durban (COP 17). A necessidade de conter as emissões de gases do efeito estufa. É chegada a hora de destinar parte das riquezas obtidas da degradação ambiental nesse objetivo urgente.


Há um ano escrevi sobre a Conferência do Clima em Copenhague (COP 15) (*) acentuando que se dera, então, uma espécie de “estudo” entre os principais partícipes, Estados Unidos e China, os maiores poluidores, nenhum dos dois querendo mostrar o seu jogo e pensarem estar “entregando os pontos” no que se refere aos seus interesses.

E, nesse estado de aparente indiferença com o tema, deixaram rolar a Conferência, sem um resultado concreto, algo efetivo que pudesse ser comemorado.

Dissera, então, que Copenhague adiara decisões para a próxima Conferência que se deu neste mês de dezembro, em Cancun, México.

Mostrei-me, então, otimista pelo número de participantes, duas centenas de países, todos sabendo que algo haveria que ser feito, mas os contendores, preocupados com suas questões internas, não deram início ao verdadeiro jogo que significa combater o aquecimento global.

A COP – 16 em Cancún com cerca de 200 países participantes seguia num ambiente morno até que, por intervenção de Patrícia Espinosa – Presidenta da Conferência e Ministra das Relações Exteriores do México - houve um início de compromisso entre as nações que pode ser assim sintetizado:

. Diminuição de 9 milhões de toneladas de emissão de CO2 até 2020 como ponto de partida para impedir que a elevação da temperatura, até o final do século, ultrapasse o limite “suportável” de 2° C;

. Criação de um “fundo verde” pelo qual seriam destinados recursos para países em desenvolvimento diminuírem suas emissões poluentes – algo em torno de US$ 30 bilhões nos próximos dois anos, com aumento progressivo até 2020, embora não definido ainda o modo como tais dotações serão constituídas e repassadas pelos países industrializados. Na carta de intenções, foi atribuído ao Banco Mundial a administração desse fundo;

. Compensações financeiras por conta da redução do desmatamento de florestas, como se dá no Brasil, o denominado REED – Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal.

Curioso que o representante da Bolívia, se pusera contrário ao acordo de Cancun, alegando que faltara consenso nas decisões e que se estabelecia um “recuo” nos compromissos anteriores o que poderia significar elevação da temperatura em até 4°. E mais, que o financiamento da preservação florestal pelos países ricos significaria a “perenização do capitalismo”. Foi vaiado, mas ficou sua preocupação quanto aos limites do aquecimento global, entre o “suportável”, 2° C até o final do século e o “insuportável”, além desse limite. Que fique o seu protesto e a vaia.

O Greenpeace, sempre crítico da relutância das grandes potências em assumir compromissos ambientais sérios afirmaria sobre Cancún: "a primeira vez em anos, governos colocaram de lado algumas de suas grandes diferenças e se comprometeram a alcançar um acordo climático.”

A verdade é que nunca se falou tanto em preservação ambiental como nestes últimos anos, claro que pelos riscos que corre a humanidade se não criar a tempo juízo e começar a cuidar de sua “casa” destinando riquezas nesse objetivo, obtidas com sua degradação enlouquecida.

A próxima conferência, no ano que vem, será na África do Sul, Durban. Lá medidas mais concretas serão firmadas, porque os tempos assim exigem. Já se trabalha com atrasos no assunto.

Paralelamente ao que se discutia em Cancún, o Governo brasileiro pelo Decreto n° 7390 de 09.12.2010, regulamentou dispositivos da Lei n° 12.187 de 29.12.2009 que instituiu a Política Nacional do Clima – PNMC.

Esse decreto define itens importantes de política ambiental que, espero, não sejam meramente programáticos. Eis as metas espontâneas assumidas para diminuir a emissão de gases do efeito estufa até 2020 contribuição do Brasil (em negrito as que considero fundamentais):

I - redução de oitenta por cento dos índices anuais de desmatamento na Amazônia Legal em relação à média verificada entre os anos de 1996 a 2005;

II - redução de quarenta por cento dos índices anuais de desmatamento no Bioma Cerrado em relação à média verificada entre os anos de 1999 a 2008;

III - expansão da oferta hidroelétrica, da oferta de fontes alternativas renováveis, notadamente centrais eólicas, pequenas centrais hidroelétricas e bioeletricidade, da oferta de biocombustíveis, e incremento da eficiência energética;

IV - recuperação de 15 milhões de hectares de pastagens degradadas;

V - ampliação do sistema de integração lavoura-pecuária-floresta em 4 milhões de hectares;

VI - expansão da prática de plantio direto na palha em 8 milhões de hectares;

VII - expansão da fixação biológica de nitrogênio em 5,5 milhões de hectares de áreas de cultivo, em substituição ao uso de fertilizantes nitrogenados;

VIII - expansão do plantio de florestas em 3 milhões de hectares;

IX - ampliação do uso de tecnologias para tratamento de 4,4 milhões de m3 de dejetos de animais ; e

X - incremento da utilização na siderurgia do carvão vegetal originário de florestas plantadas e melhoria na eficiência do processo de carbonização.

Na verdade acho que “redução de 80% no desmatamento da Amazônia e 40% no bioma do Cerrado são insuficientes – não haveria mais tolerância ao desmatamento - a menos que haja a recuperação efetiva das pastagens degredadas em milhões de hectares e o reflorestamento como preconizado.

No meu artigo “Resenha Ambiental” de 21.11.2010 me referi à devastação do Cerrado, cujas árvores eram transformadas em carvão para sustentar altos-fornos de Siderúrgicas de Minas Gerais. A notícia que analisara nessa “Resenha” dava conta de que os fornos de carvão estavam desativados, mas não havia explicação por qual carvão continuavam operando as siderúrgicas.

Eis o que sustenta o item X acima: o uso de carvão vegetal de “florestas plantadas”. Isto significa que até agora há matas e florestas sustentando essas usinas criminosas. Não posso, pelo texto do decreto, ser censurado por essa conclusão. Haveria que se exigir de tais indústrias que modernizassem seus equipamentos para parar com a devastação das florestas transformadas em carvão, quaisquer que sejam elas.

Paro por aqui. Vamos lutando, caminhando que o tempo exige!

(*) “Copenhague adia vínculos para o México em 2010” de 21.12.2009

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

DO FIM DE MANDATO À SOBERBA

O lapso curto até a posse de Dilma Roussef. A renovação que não houve no quadro ministerial. A esperança que ela conduza seu governo sem receio de contrariar seu padrinho.

Não escondi minha preferência pelo candidato da oposição que disputou a eleição presidencial.

E assim me posicionei porque entendia, como entendo, que chegara o momento, como nunca, da alternância do poder, de tal modo que alguns ranços fossem expungidos da prática nacional e até mesmo a soberba manifestada pelo atual presidente da República. E também uma revisão da política externa, tão capenga com destaque nas relações com alguns países africanos, com o Irã e mais próximos, países vizinhos, destacando-se os equívocos de Hugo Chaves de certo modo apoiado em todos os desmandos que pratica contra o sistema democrático, enquadrar Evo Morales e repensar as relações com Cuba atrasada, que se faz de vítima do embargo americano para justificar todos os desastres do regime dito “comunista” que tardiamente começa a se autocriticar anunciando medidas impopulares.

Venceu Dilma e, efetivamente, no decorrer da campanha , seu discurso foi se refinando. Não reagia mais às críticas, muitas justas, com dedo em riste, um modo de demonstrar que amealhara ou a tanto buscava, o equilíbrio suficiente para assumir o mais alto cargo público do País. A propósito, ao contrário de Lula, a eleita rejeita qualquer tolhimento à imprensa de onde parte a maioria das denúncias aos desmandos oficiais.

A vitória de Dilma teve como conseqüência, a permanência de Lula em plena atividade e, pelo que transparece influenciou sua candidata vitoriosa em acolher sua cota de ministros de sua “confiança”, entre eles Nelson Jobim e Gilberto Carvalho, este dos mais íntimos de Lula.

Além da “quota” de Lula, há a “quota” do PMDB de sempre, esse partido que, pode até garantir a governabilidade, mas é acintoso na busca de cargos. Há décadas que é assim.

Livre Lula para discursar já que vitorioso, em algumas de suas manifestações se denotam doses de soberba. Uma delas se dera nos tempos do escândalo do “mensalão”. Segundo revelara, dissera a Sarney, então, que “se eles (oposição) tentarem dar um passo além da institucionalidade, eles não sabem o que vai acontecer nestes pais”. E nesse sentido, segundo Lula, não fora tentado pela oposição seu impedimento por “medo do povo”, porque ele seria a própria “encarnação” dele, povo.

Uma bravata.

As coisas não foram assim. O país vinha ferido pela morte de Tancredo Neves, envergonhado com a inflação no governo Sarney, um acidente de percurso, pelo impedimento de Fernando Collor num processo traumático e, nesse clima, mais um escândalo desse nível só prejudicaria o País. E para amenizar sua posição delicada, então, todos “acreditaram” que “ele (Lula) nada sabia” do “mensalão” como, constrangido, afirmara.

Em escala menor, em 1980, na greve dos mais de 40 dias no ABC, Lula foi destituído do Sindicato de São Bernardo do qual era presidente, e logo depois preso no DEOPS, sem que houvesse grandes protestos dos seus “companheiros”. Nem o apoio político mudou muita coisa naqueles dias de conflito.

Um processo corretamente conduzido, como se dera com o de Collor, o povo ficaria perplexo e boquiaberto, só isso, concluindo que este País não tinha jeito mesmo.

Mas, nem tudo está perdido na sua fala e muita coisa poderia ser diferente na campanha se reconhecesse Lula o que reconheceu num outro discurso recente. Nestes termos:

"Eu tenho consciência que outros presidentes da República não tiveram as mesmas condições que eu. O presidente Sarney pegou o Brasil em época de crise. O Fernando Henrique Cardoso, mesmo se quisesse fazer, não poderia, pois o Brasil estava atolado numa dívida com o FMI. Quando você deve, tem até medo de abrir a porta e o cobrador te pegar.”

Estamos hoje a 26 dias da posse de Dilma Rousseff. O lapso é curto. Espero que com sua posse, o discurso mude, seja mais coerente, sem bravatas e gafes tão comuns nos discursos de seu padrinho. E que imponha seu governo com efetividade sem receio de contrariar posições daquele que finalmente deixa o poder.