quarta-feira, 14 de novembro de 2018

DA “JURISPRUDÊNCIA PERVERSA”


Recentemente adveio a Lei n° 13728/2018, que acrescentou o artigo 12A à Lei nº 9099/95 para estabelecer que nos Juizados Especiais Cíveis todos os prazos não serão mais contados em dias corridos, mas em dias úteis, em linha com o que passara a estabelecer o Código de Processo Civil de 2015.
Essa questão, se nos Juizados Especiais os prazos eram contados em dias corridos e não úteis geravam dúvidas e não só, mesmo perplexidades.
O argumento é que a Lei nº 9099/95 seria “especial” não se subordinando ao Código de Processo Civil que seria uma lei geral.
Ora, os que defendiam e defendem a aplicação do CPC aos Juizados Especiais têm como argumento que o processo é “geral”, especialmente em situações relevantes pelo que haveria que ser aplicado de modo a integrar suas disposições, dando coerência ao todo.
Porque no processo é que se encaminha a busca pelo direito não podendo, então, estar subordinado a interpretações que o tolhem.
Nessa linha, a Associação dos Advogados de São Paulo divulgou há pouco, artigo do professor José Rogério Cruz e Tucci, sob título “A cruzada da AASP contra a perversidade da jurisprudência” do qual se extraem os trechos seguintes:
Reunidos em expressivo número, os atuais conselheiros da AASP e 11 de seus ex-presidentes, inclusive de seu ilustre decano, Mário Sérgio Duarte Garcia, a conclusão extraída, na mesma linha das premissas traçadas no já referido manifesto, foi a de que a denegação de justiça decorrente da incidência da “jurisprudência defensiva (rectius: perversa)” não ofende apenas o exercício profissional dos advogados, mas, na verdade, afronta diretamente o direito das partes e, assim, da sociedade como um todo. É dizer: o não conhecimento de um recurso fundado em premissa exclusivamente formal e estéril acaba fulminando, ex radice, as expectativas dos litigantes quanto à tutela jurisdicional que lhes é assegurada, com todas as letras, pelo artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
Como já tive oportunidade de ressaltar em anterior estudo, para combater essa verdadeira vertente inescrupulosa dos tribunais pátrios, inexcedível sob a vigência do revogado Código de Processo Civil, o novo diploma processual contemplou três regras preciosas, em defesa da sociedade brasileira. Refiro-me aos artigos 932, 1.007 e 1.029, parágrafo 3º, que têm por precípua finalidade contornar o não conhecimento dos recursos por defeitos formais.”
O professor titular de direito da USP, chama essa “jurisprudência defensiva” de “perversa” porque “afronta diretamente o direito das partes”.
O Autor faz ressalvas a dispositivos processuais que amenizam essa “jurisprudência perversa”, como o artigo 1007 do CPC que permite que a parte que tenha realizado preparo de recurso (depósito a menor) tem a possibilidade de completá-lo no prazo de cinco dias de tal modo que não seja decretado deserto.
Mas, se essa faculdade é aplicável a todos os recursos, mesmo para as instâncias superiores, não vale para os Juizados Especiais porque a súmula 80 do FUNAJE – Fórum Nacional dos Juizados Especiais veda de modo peremptória a complementação.
O mesmo se dera com a contagem em dias corridos e não em dias úteis, vedada pela súmula 165 do mesmo FONAJE. Nesse caso, foi necessária uma Lei para alterar essa orientação unilateral e desprovida de sentido à luz do processo civil.
Pois bem, o que se dá com os recursos inominados decretados desertos nos JECs por preparo inferior sem possibilidade de complementação?
O valor insuficiente recolhido passa a se situar numa zona tributária incerta, amealhada pela Fazenda do Estado, sem que tenha se dado a prestação jurisdicional e sem a possibilidade de ressarcimento ou nada que seja fácil.
Ora, o inciso XXXV do artigo 5º da Constituição determina que a “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
Uma situação dessa natureza regulada pela súmula 80 da FUNAJE seria rejeitada até mesmo pelas disposições do CDC se aplicável fosse.