Quantas
vezes já informei que na década de 70 trabalhava na indústria
automobilística. Nas greve de 1978 – um marco político – era profissional de Relações Trabalhistas na fábrica
da Chrysler de Santo André.
A partir daí
acompanhei na “intimidade” todo o movimento político-sindical, daqueles tempos participando no
âmbito da empresa de todos os episódios.
Para que se
tenha uma noção da relevância do acordo que pôs fim às greves de 1978, o seu texto com orgulho foi
pendurado como quadro honroso na sala de muitos dirigentes empresariais que passaram a considerar Lula uma figura nova, um nova face
no sindicalismo, autêntico.
Os trechos
abaixo foram extraídos do meu livro “Sindicalismo e Relações Trabalhistas” até
chegar nas greves de 1980 quando João Figueiredo, de modo “ameno” se refere a
Dom Paulo Evaristo Arns ("os salários são baixos", dizia ele).
Dom Paulo faleceu em 14 de dezembro de 2016.
Dom Paulo faleceu em 14 de dezembro de 2016.
Trechos (na cor azul):
Nas eleições de dezembro de
1978 o MDB lançou como candidato de oposição, o general Euler Bentes Monteiro.
No colégio eleitoral o “sim” já foi bem mais escasso, refletindo, aliás, aquele
clima de abertura: Figueiredo foi eleito pela ARENA com 335 votos, contra 266
conferidos ao candidato da oposição.
João Figueiredo, reconhecendo
que o país não tinha democracia sentenciaria: “Reafirmo: é meu propósito
inabalável fazer deste país uma democracia.”
O mais duro teste não se
fez esperar.
A posse de João Figueiredo,
em 15.03.1979, fora marcada por um grande movimento grevista no ABC, coordenado
pelos sindicatos dos metalúrgicos que tivera início no dia 13.
Essa greve - com forte
motivação política pelo momento de sua deflagração, agora comandada pelos
próprios sindicatos -, era respaldada por assembleias que atraiam milhares de
trabalhadores. Essas assembleias eram realizadas num estádio de futebol, de
Vila Euclides, em São Bernardo do Campo, que se tornou famoso por essas
concentrações.
A greve deflagrada
basicamente por discordarem os metalúrgicos dos critérios de reajustamento
salarial propostos pelos empregadores e por insistirem na instituição de
comissões de fábricas - resultou na intervenção nos sindicatos (de Santo André
e São Bernardo do Campo) pelo Ministério do Trabalho.
Mas, após negociações de
bastidores, chegou-se a uma solução provisória para o impasse onde se acordou
uma trégua de 45 dias, período em que a greve foi suspensa. Vencido esse
período, achado um acordo definitivo, a intervenção foi revogada, reassumindo
os dirigentes afastados pelo ato oficial. O retorno foi emocionante, porque
Lula contava com a simpatia da imprensa e da população em geral (incluindo os empresários).
Ressalte-se que nas
comemorações do 1° de Maio, dentro da trégua de 45 dias - num momento em que as
negociações estavam ainda indefinidas - com a participação de dirigentes
sindicais de diversas categorias, realizou-se no estádio de Vila Euclides,
seguramente, uma das maiores concentrações operárias dos últimos tempos. Um momento
emocionante foi a leitura da poesia “Operário em Construção” de Vinicius de
Moraes, presente ao ato:
(...)
“Via tudo o que fazia
O lucro do seu patrão
E em cada coisa que via
Misteriosamente havia
A marca de sua mão.
E o operário disse: Não !
- Loucura ! - gritou o patrão
Não vês o que te dou eu ?
- Mentira ! - disse o operário
Não podes dar-me o que é meu.”
(...)
Foi a partir dessa greve
que a Igreja Católica passou a apoiar ostensivamente o movimento operário.
Havia um ano que, na televisão, Lula criticara a pouca atenção e apoio que dava
a Igreja aos movimentos operários.
O bispo de Santo André, Dom
Claudio Hummes, que chegou a participar da solução do conflito convidado para
uma reunião em Brasília com o Ministro do Trabalho, em comunicado em que
explicava a “atuação da Igreja apoiando a greve dos metalúrgicos do ABC”, diria
que pretendia “como pastor defender os direitos fundamentais dos
metalúrgicos e apoiar suas justas reivindicações”. E concluía afirmando que
continuava “a distribuição de alimentos às famílias dos metalúrgicos
atingidos pela greve”.
(...)
Nesse período difícil,
refletindo uma crise que se iniciara em 1980,
grandes movimentos grevistas foram deflagrados.
Em 1° de abril desse ano, teve início no ABC
mais um movimento paredista dos metalúrgicos que buscavam aumento de
produtividade de 15%. As negociações não prosperaram. Todavia, ele poderia ter
se encerrado logo no seu início quando, surpreendentemente, o Tribunal Regional
do Trabalho de São Paulo, declarou-se incompetente para julgar a legalidade da
greve e, no mesmo julgamento, concedia praticamente todos os pleitos salariais
dos trabalhadores. Houve a promessa dos empresários nos bastidores, de que as
empresas cumpririam a decisão judicial.
Mas, a greve prosseguiu
porque fora incluída nas reivindicações, então, a estabilidade no emprego.
Além, é claro, da projeção política buscada pelos dirigentes sindicais que
lideravam o movimento.
Com essa atitude, nova
intervenção nos Sindicatos de São Bernardo e Santo André, prisão de todos os
líderes sindicais nas celas do DEOPS, confrontos seguidos entre policiais e
políticos do PMDB solidários com os grevistas, mantendo a cidade de São
Bernardo do Campo por semanas em clima de tensão e caos.
(...)
A situação dos sindicatos
sob intervenção só começou a se regularizar a partir de 1981, quando a FIESP
revelou que não negociaria com os interventores nomeados.
Esse movimento grevista,
que durou 41 dias, abusado ou não, alcançou forte repercussão e solidariedade
internacional.
A partir daí, o direito
de greve tornou-se uma realidade, a despeito da vigência da Lei n° 4.330/64
e do Decreto-lei n° 1.632 de 4.8.1978 que a proibia nos serviços públicos e nas
atividades essenciais de interesse da segurança nacional. Absurdo jurídico ?
Sim, absurdo jurídico !
(...)
A Igreja Católica já vinha
dando apoio aos movimentos grevistas, como já vimos, em particular, naqueles
ocorridos no ABC.
Durante a greve de 1980,
numa entrevista, o Presidente João Figueiredo assim se posicionou sobre o
envolvimento da Igreja:
“- Como Sr. vê a
participação da Igreja no episódio ?
- Vejo mal, muito mal. Mas
não é a Igreja, são certos segmentos dela. Muitos bispos também têm me
procurado e manifestando posição contrária àquela assumida pela Igreja em São
Paulo, dizendo que não concordavam com ela.
- E a nota da CNBB sobre a
greve ?
- A CNBB não é a Igreja.
- Então é só uma parte da
Igreja que apoia os metalúrgicos ?
- É verdade, a Igreja está
dividida.
- Os sacerdotes estão liderando a greve ?
- Não sei se estão
liderando ou não. Mas estão dando a impressão à opinião pública de que estão se
colocando contra a lei.
- E D. Paulo Evaristo Arns ?
-Não conheço. Nunca tive contato com ele, mas pelas manifestações
que tenho, ele está incitando a greve”.
Dentro da Igreja, essas
afirmações geraram polêmica, especialmente aquelas relativas à CNBB.
Muito já se disse sobre Dom Paulo inclusive sua participação para
derrubada gradativa do poder militar. Religioso corajoso, saiu sempre em defesa
dos mais necessitados atuação que nem sempre mereceu a compreensão daqueles que
veem a eclosão do comunismo como um fantasma que assombra tal qual o fogo
fátuo. Nessa quadro cheio de alternativas, no tocante ao movimento sindical o
qual ele apoiou, no meu livro “Joana d’Art”
quando me refiro, digamos, à memória daqueles idos que de tão perto acompanhei,
reconheci:
“Não foram muitos os
que se decidiram por aquele espírito belicoso incluindo os que rumaram meio às
cegas, mas vários foram os militantes que se deram mal. Esse tipo de oposição
fora instituída num momento de arrogância militar. Um erro. Haveria que esperar o momento começando por discutir
ideias.
O regime militar haveria que se enfraquecer como resultado de sua
fadiga. Cairia de velho. O sindicalismo no ABC por linhas tortas tivera essa
percepção mesmo que de modo ocasional. Não importa. De um modo ou outro deram
contribuição para a queda do regime
militar mais tarde.”
PS: como já disse vezes outras o meu livro "Sindicalismo e Relações Trabalhistas" constitui-se na minha ex-futura obra prima.
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