01/03/2010
O constrangimento de Lula em Cuba com a morte de dissidente cubano em greve de fome. As violações dos direitos humanos em Cuba e o plano de direitos humanos no Brasil. As contradições entre a tolerância aos Castro e o que vem se pregando no Brasil.
Torturas e torturados apresentam elementos estranhos aqui no Brasil.
Relata Ernesto Geisel o seguinte:
“Acho que a tortura em certos casos torna-se necessária, para obter confissões. Já contei que no tempo do governo Juscelino alguns oficiais, inclusive o Humberto de Melo, que mais tarde comandou o Exército em São Paulo, foram mandados à Inglaterra para conhecer as técnicas do serviço de informação e contra-informação inglês. Entre o que aprenderam havia vários procedimentos sobre a tortura. O inglês, no seu serviço secreto, realiza com discrição. E o nosso pessoal, inexperiente e extrovertido, faz abertamente. Não justifico a tortura, mas reconheço que há circunstâncias em que o indivíduo é impelido a praticar a tortura, para obter determinadas confissões e, assim, evitar um mal maior.” (1)
Contemporâneo de Juscelino, Fidel Castro, em janeiro de 1959 por um movimento revolucionário armado derrubou Fulgêncio Batista, assumindo o poder em Cuba. Com os diversos atos autoritários, provocou a fuga de milhares de dissidentes da Ilha para Miami até porque implantara o “paredão” para os aliados do regime deposto. Presos políticos aos milhares. A liberdade de opinião foi vedada na linha de um regime ditatorial que se qualificaria como socialista.
À sua assunção ao poder, em entrevista à revista “Veja” de 24.09.2003, disse Fidel Castro:
Quando triunfou nossa revolução, aqueles que haviam assassinado milhares de nossos compatriotas, e os que haviam torturado dezenas de milhares de cubanos, esses nós julgamos segundo as leis revolucionárias, em tribunais revolucionários. E os maiores criminosos, os responsáveis pelos casos mais graves de torturas e maus-tratos, foram condenados e fuzilados. Nunca negamos isso. Dissemos ao povo que não queríamos vingança, que não queríamos gente arrastada pelas ruas nem edifícios saqueados. Queríamos ordem. Mas tinha que haver Justiça... (2)
Há 51 anos governando a Ilha, deixando o poder para o seu irmão Raul, Cuba constitui-se um país falido, que parou no tempo sendo comum culpar os Estados Unidos por tudo, especialmente pelo embargo econômico imposto naqueles dias perdidos há décadas.
Fidel se acomodou no seu mundinho socialista e não buscou alternativas que movimentassem sua economia em qualquer país que aceitasse a parceria. Fechou-se no seu empobrecimento social e econômico.
Em termos de direitos humanos, ao longo de todo esse tempo, Cuba não os respeitou e não os respeita. Mantém presos políticos em condições difíceis o que a torna um país fora das prioridades de países que poderiam ajudá-lo a sair do marasmo que lhe impôs Fidel Castro. Lá vão o caricato Hugo Chaves que pouco tem a oferecer até porque está levando a Venezuela para estagnação semelhante, Lula no beija-mão, saudosista e outros menos expressivos.
Foi muito discutido neste portal, inclusive por mim, o “programa nacional de direitos humanos”, um calhamaço programático oficializado por decreto assinado mas não lido por Lula que entre tantos itens, foram postas algumas regras autoritárias, como o controle da imprensa, privilégios aos invasores de propriedades rurais privadas dificultando a ação do Pode Judiciário no ato de reintegração e especialmente a revogação, por nova “interpretação”, da Lei da Anistia de 1979.
Eis como são as “ironias da vida”, um fato que deixou Lula numa situação bastante constrangedora: aterrissando em Cuba para o beija-mão de um líder político que nada tem a oferecer, eis que no exato momento, em greve de fome morria um preso dissidente do regime cubano, Orlando Zapata.
Lula apenas lamentou a morte do “ser humano” equivocado com a decisão da greve de fome que ele não recomendaria a ninguém praticar porque já se arriscara a ela. Nada mais disse sobre a repressão cubana.
Raul Castro afirmou que no seu país não há tortura, porque seria repetir os métodos do deposto Batista.
Mas, e ai está o “mas”, a mãe do dissidente morto, Reina Luisa Tamoyo reagindo às afirmações de Raul Castro de que a culpa de Zapata se devia “à luta ideológica contra os Estados Unidos”, afirmaria:
É um cínico! Não permito que ele envie mensagens porque meu filho leva impregnado em seu corpo os golpes e as torturas.” (3)
Se sim, se não, quanto à tortura, desde sempre Cuba não foi (e não é) modelo de direitos humanos.
Não serviria para Fidel e Raul, pois, o programa brasileiro de direitos humanos, salvo na parte que trata do controle da imprensa e talvez na liberdade de ocupação de terras rurais. No mais, quase tudo o que consta daquele calhamaço não seria aplicável na Ilha.
E nesse embate há uma frase emblemática ainda sobre os eflúvios da visita de Lula a Cuba que partiu de Marco Aurélio Garcia – Assessor Internacional do Palácio do Planalto proferida em alto e bom som:
“Há problemas de direitos humanos no mundo inteiro”. (4)
Aonde, senhor assessor? Na Venezuela? Na Coréia do Norte? No Irã? Em quais aliados mais?
O que fizera esse assessor fora, no que se refere a Fidel – Raul Castro (tentar) ignorar ou minimizar o passado “anistiando” ambos a par de relevar as sempre presentes violações dos direitos humanos em relação aos dissidentes políticos cubanos.
Ora, diante disso, qual a moral que sobra desse plano de direitos humanos no Brasil se praticamente tudo o que aqui se pretende rever ou implantar não serve para Cuba? Se os porta-vozes que relevam os abusos em Cuba são os mesmos que se aferram em defender o plano de direitos humanos no Brasil?
É notório o sentido de contradição, de incoerência e de imaturidade nisso tudo.
No tocante aos beneficiados de ambos os lados nos conflitos no Brasil durante a ditadura, a indesejável revogação da Lei da Anistia em relação aos acusados de tortura, alcançaria uma turma idosa que pouco teria que responder. O coronel Erasmo Dias, para exemplificar, morreu há pouco com 85 anos. (5)
Por isso digo e repito. O tempo passou, demais...
Concluo revelando toda a minha perplexidade. Este país é assim: até no governo de Juscelino, democrático, conforme revelou Geisel, militares foram treinar técnicas de repressão na Inglaterra...durante o seu governo. Que tempos aqueles!
Dá para acreditar?
Referências no texto:
(1) Livro “Ernesto Geisel” – Organizadores Maria Celina D’Araujo e Celso Castro (FGV Editora – 2ª Ed. – pag. 225)
(2) Revista Veja, edição de aniversário de 35 anos (24.09.2003)
(3) Jornal “O Estado de São Paulo” de 26.02.2010
(4) Jornal “O Estado de São Paulo” de 25.02.2010
(5) Secretário da Segurança Pública de São Paulo que em 22.09.1977 determinou a invasão da PUC pela tropa de choque e agentes do DOPS que naquela Universidade estudantes reorganizavam a UNE
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